sábado, 30 de abril de 2016

Game of Thrones ganha exposição de arte imersiva em Nova York

By  / Fotografias: Slaven Vlasic/Getty Images for HBO
Traduzido e adaptado por Elizeu Silva

Vista parcial da exposição de arte imersiva da HBO Art of Thrones, no The Angel Orensanz Foundation, de Nova York


Grande blockbuster do canal HBO, a série de fantasia Game of Throne retornou em abril deste ano para delírio dos fãs. Porém, antes de descobrir se Jon Snow está realmente morto (nossa tese: muito provavelmente, ou melhor, definitivamente, não está), a rede oferece aos fãs a possibilidade de conhecer Westeros através de uma instalação artística interativa montada em Nova York.

A exposição denominada Art of the Throne é composta por trabalhos autorizados de cinco artistas inspirados nos cenários e nos acontecimentos da série de televisão. A ambiciosa instalação foi apresentada inicialmente a um grupo selecionado de espectadores, em 20 de abril em Nova York. Quem não foi escolhido ou não pode ir a Nova York, pode matar a curiosidade assistindo alguns vídeos online disponibilizados pelo canal, que mostram os bastidores das criações dos artistas.

“O Casamento Vermelho”
O que esperar da exposição? O coletivo de artistas gráficos Pop Chart Lab, do Brooklyn, apresenta um manuscrito iluminado com 3,66 metros de altura, esculpido em vidro vermelho. O trabalho é inspirado numa cena central da terceira temporada, o “Casamento Vermelho”, durante o qual a família Stark é brutalmente assassinada numa conspiração orquestrada por Lord Walder Frey, Roose Bolton e Tywin Lannister. “É uma coisa agressiva e difícil de apreciar, porque são 3,6 metros de vermelho brilhante”, afirma o designer Ashley Walker.

Outro trabalho, produzido pela dupla de artistas do Cyrcle, consiste numa sala espelhada em forma de coroa invertida, toda dourada, que remete às constantes mudanças nas estruturas de poder da série. Para obter o efeito completo da instalação, intitulada Overthrone, os visitantes devem caminhar dentro da estrutura ou ler algum poema escrito na parte interna da coroa.

Overthrone, produzida pelo Cyrcle
Daenerys Targaryen foi a musa inspiradora do grafiteiro Tristan Eaton, de Los Angeles, que criou uma série de retratos da Mãe dos Dragões num Pop Art que lembra Andy Wahrol.

Retratos de Daenerys Targaryen, por Tristan Eaton

O ilustrador Marcos Chin foi mais cativado pela cavaleira e guerreira Brienne of Tarth, a quem ele chama de “durona” (assista os vídeos indicados abaixo). A representação animada dela será projetada no encerramento da exposição.

O escultor em papel Jeff Nishinaka se mostra apavorado e excitado com o exército dos White Walkers. Ele enfrentou seus medos com a criação do guerreiro que vence Jon Snow no fim da quinta temporada. Com pedaços de papel branco cortados e dobrados, ele dá vida à face feroz e gelada da criatura.

White Walker em papel, de Jeff Nishinaka

Os dois primeiros vídeos contendo entrevistas com os artistas participantes da exposição podem ser assistidos no Vibe (clique aqui e aqui) ou no site da HBO. Um vídeo exclusivo, com mais detalhes sobre como as instalações foram criadas, pode ser visto desde 21 de abril no canal da HBO no Now.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Deus está morto e os meninos tocam rock



No meu aniversário de 18 anos ganhei uma festa preparada por alguns amigos sinceros. Conversa vai, conversa vem, chegou a hora de soprar as velas e então me impuseram um ritual que denota claramente o caráter crédulo do grupo: eu deveria revelar algum dos meus desejos mais íntimos, para que este se realizasse. Para decepção geral, falei apenas platitudes. No entanto, no ouvido de uma garota em quem estava de olho, segredei que gostaria de escrever um livro e vê-lo publicado. Meu sonho tinha um quê de sublime, pois consistia no desejo de falar às mentes, de indicar caminhos, de influenciar pessoas. Era meu modo particular de querer ser deus.

Não me recrimino, pois este não era um anseio apenas meu (embora lamentavelmente eu estivesse entre os últimos a admitir a inocuidade daquela pretensão). Até John Lennon, o expoente beat e pré-hippie, que teve a mórbida honra de compartilhar com Jean-Paul Sartre o 1980 como ano derradeiro da vida, pois sim, nem o beattle mais famoso conseguiu evitar (ou furtar-se) uma insuspeitada queda pelo desejo de divindade. (I hope some day / You'll join us / And the world will live as one – Imagine). Não fossem agourentos da estirpe de Nietzsche, Kierkegaard, Schopenhauer, Heidegger, meu sonho juvenil faria todo sentido. No entanto deus já estava morto e eu não sabia. Sim, demorei a perceber o desaparecimento do sublime, mas convenhamos: existências milenares não podem desaparecer de uma hora para a outra.

Ao longo do século XX, nos estertores da divindade, ainda havia muita gente querendo ser deus. De Martin Luther King a Adolf Hitler, de Stalin a Thatcher, passando por Mandela, Guevara, Gandhi, Madre Teresa e uma infinidade de outros. Não é legítimo que eu também almejasse meu quinhão?

Deparei-me com estes pensamentos dias atrás, depois de assistir a apresentação da banda Reback num bar da Zona Norte de São Paulo. São 5 garotos sonhadores igual fui um dia (Victor Abdo, Giovanni Bócoli, Vinícius Leal, Diego Fernandes e Douglas Carvalho), que tocam um rock pesado e convincente. Descontada a limitação técnica do ambiente e dos equipamentos e o fato de eu não apreciar o estilo punk defendido pela banda, restou uma apresentação honesta de quem não quer mudar o mundo e nem construir futuro algum. Tão óbvio quanto a banda Reback sonha com palcos mais nobres e público maior que os amigos presentes ao bar, soa cristalino que não pretendem ser deuses.

Não querem mesmo. Basta observar o som pesado que fazem como acompanhamento às palavras gritadas ao microfone e o visual grunge que adotam. No conjunto, são itens de uma plástica eloquente que desnuda o télos inexistente. Não há deus, não há nada além da mera existência. Eles sabem disso e só querem tocar rock. Vivem da fé de que o rock se basta e por isso querem apenas tocar rock. Algum demérito nisso? Não, nenhum. Antes, reconheça-se que se entregam verdadeiramente àquilo que creem, pois com ou sem deus, é fundamental que a verdade sobreviva.

Reverências para os garotos do Reback, pois, como proclamou Allen Ginsberg ao descobrir a morte do divino, “o vagabundo é tão sagrado quanto o serafim”.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Que País é Esse?


Sexta-feira (31) levei minhas filhotas para assistir a queima de fogos na Paulista. Na falta de um local à altura de Copacabana, a avenida que representa o poder financeiro da cidade e do país é o local onde os paulistanos se reúnem para comemorar a virada do ano.

Dificuldades para estacionar o carro nos atrasaram para a queima. Chegamos quando o Capital Inicial assumia o palco tocando baladinhas recentes seguidas por tijoladas de outrora. Na parte melhor da apresentação, a banda tocou “Fátima”, “Veraneio Vascaína” e, dando uma de Legião Urbana, “Que País é Esse?”. Considerando a recente elevação da autoestima nacional e a véspera da posse da nova presidente, achei a música meio deslocada, fora de contexto. Ficou ainda mais atemporal quando uma parte da plateia respondeu cantando: “É a Porra do Brasil!”.

Eu sei, eu sei, não se julga ninguém por uma frase gritada durante um show – por mais modesto que seja o tal show. Mesmo assim, assumo o risco de afirmar que a música de protesto da Legião Urbana virou, de uma hora para outra, hino reacionário.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Álvaro Dias: "será mais fácil fazer oposição"


O Brasil acordou em 1 de novembro com uma nova presidente. A 40ª na história republicana, primeira mulher a governar o país.


Alegria para mais de 55% dos eleitores, inconformismo para os setores derrotados. Na TV, o senador Álvaro Dias afirma que será muito mais fácil fazer oposição a Dilma Rousseff do que ao presidente Lula, já que ela não conta com “o preparo e a inteligência” daquele. Pode até ser verdade. No entanto, há algo mais importante no ar que ainda não foi devidamente captado pela oposição: a época da política arrogante passou.

Luis Inácio Lula da Silva governou com humildade, buscando contato direto com o povo, ouvindo seus anseios, fazendo o possível para oferecer respostas objetivas ao que lhe era solicitado. O povo precisa de comida? Dê-lhe Bolsa Família. Precisa de moradia? Dê-lhe Minha Casa, Minha Vida. Deseja estudar? Dê-lhe Prouni. Está no escuro? Dê-lhe Luz Para Todos. Ao invés de elucubrações complicadas (conversa para boi dormir) típica de quem acha que pode levar o povo na lábia, respostas objetivas. Foi justamente por se voltar para os pequenos que Lula se tornou grande internacionalmente – estatura que tende a crescer ainda mais se o governo da presidente Dilma for bem sucedido. Se não, resta a possibilidade dele retornar em 2014.

A oposição se perdeu em falatórios e guerra de egos. Aécio Neves é acusado de ter feito “corpo mole” durante a campanha em MG – acusação evidenciada pelo fato do estado ter elegido Dilma Rousseff. Álvaro Dias, que amanheceu na segunda-feira cantando de galo, dias atrás chorava pitangas por ter sido preterido para o posto de vice na chapa de Serra. “Eu fui traído desde o primeiro momento no Paraná pelo meu partido”, afirmou ao IG em 29 de setembro. A história mostra que a arrogância desta agremiação vem de longe: em 2006 o então candidato à presidência Geraldo Alckmin foi abandonado pelo atual derrotado José Serra, por Aécio Neves, por Tasso Gereissati, por FHC e pelo próprio Álvaro Dias, fato que lhe custou (e ao partido, obviamente) uma acachapante derrota com o cruel requinte de obter menos votos no segundo turno do que havia alcançado no primeiro. Em 1984 Fernando Henrique (então no PMDB) tinha tanta certeza da vitória que se deixou fotografar como prefeito de São Paulo antes mesmo das eleições. Acabou perdendo para Jânio Quadros.

O fato é que, por falta de discurso, a oposição se torna medíocre e transforma o debate político em guerra de comadres. Os avanços sociais do governo Lula não deixaram migalhas para a oposição que governou durante 8 anos como se não houvesse pobres no Brasil e respondia os anseios populares com erudição vazia. Isso não funciona mais, pois qualquer analfabeto já se deu conta de que a lógica neoliberal do estado mínimo não enche barriga.

Esta oposição carece de discurso e de rumo. A menos que consiga abandonar a postura arrogante e aprender com os próprios erros, seguirá derrotada por muitos anos - talvez mais uma década.

Já vai longe o tempo em que o presidente da República podia declarar que preferia o cheiro de seus cavalos ao do povo – como o fez o general João Baptista Figueiredo. Só que ele não dependia do povo para ser presidente. Quem depende do voto popular, ou supera a arrogância ou continua derrotado.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Rapaz denuncia quem teria jogado objeto em José Serra


Com a condição de sigilo, um rapaz afirmou que a bolinha de papel que atingiu o candidato José Serra foi atirada pelo coordenador da campanha do tucano, o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE). Segundo a fonte, Guerra queria chamar a atenção do candidato mas não conseguia, por causa da distância. Decidiu então amassar um bilhete que trazia no bolso e arremessar em José Serra. Assista o vídeo da reportagem feita pelo SBT e reproduzida no Youtube.

Guerra ficou profundamente preocupado, por saber que Serra tem miolo mole e que nada pode atingir sua cabeça, pois ele sente tonturas e náusea. No entanto, em seguida ficou ficou aliviado ao perceber que nada tinha acontecido ao candidato, mas a tranquilidade durou apenas 20 minutos. Um manifestante do PT ligou para o ex-governador e o avisou que ele tinha sido atingido. “Foi pura maldade! Só para prejudicar o Serra”, revolta-se o informante. “Ele nem tinha percebido, mas aí vem esse mau caráter e avisa e o candidato começou a passar mal”.

O boletim médico divulgado hoje de manhã informa que o candidato continua abilolado.

MENTIRA POR MENTIRA, PREFIRO A MINHA.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Marina... você se pintou?

Nunca tinha reproduzido textos de outros autores no meu blog. Mas a carta aberta à senadora Marina Silva, escrita pelo filósofo Maurício Abdalla, justifica a exceção.

Maurício Abdalla*

“Marina, morena Marina, você se pintou” – diz a canção de Caymmi. Mas é provável, Marina, que pintaram você. Era a candidata ideal ideal:mulher,militante, ecológica e socialmente comprometida com o “grito da Terra e o grito dos pobres”, como diz Leonardo.
Dizem que escolheu o partido errado. Pode ser. Mas, por outro lado, o que é certo neste confuso tempo de partidos gelatinosos, de alianças surreais e de pragmatismo hiperbólico? Quem pode atirar a primeira pedra no que diz respeito a escolhas partidárias?
Mas ainda assim, Marina, sua candidatura estava fadada a não decolar. Não pela causa que defende, não pela grandeza de sua figura. Mas pelo fato de que as verdadeiras causas que afetam a população do Brasil não interessam aos financiadores de campanha, às elites e aos seus meios de comunicação. A batalha não era para ser sua. Era de Dilma contra Serra. Do governo Lula contra o governo do PSDB/DEM. Assim decidiram as “famiglias” que controlam a informação no país. E elas não só decidiram quem iria duelar, mas também quiseram definir o vencedor. O Estadão dixit: Serra deve ser eleito.
Mas a estratégia de reconduzir ao poder a velha aliança PSDB/DEM estava fazendo água. O povo insistia em confirmar não a sua preferência por Dilma, mas seu apreço pelo Lula. O que, é claro, se revertia em intenção de voto em sua candidata. Mas “os filhos das trevas são mais espertos do que os filhos da luz”. Sacaram da manga um ás escondido. Usar a Marina como trampolim para levar o tucano para o segundo turno e ganhar tempo para a guerra suja.
Marina, você, cujo coração é vermelho e verde, foi pintada de azul. “Azul tucano”. Deram-lhe o espaço que sua causa nunca teve, que sua luta junto aos seringueiros e contra as elites rurais jamais alcançaria nos grandes meios de comunicação. A Globo nunca esteve ao seu lado. A Veja, a FSP, o Estadão jamais se preocuparam com a ecologia profunda. Eles sempre foram, e ainda são, seus e nossos inimigos viscerais.
Mas a estratégia deu certo. Serra foi para o segundo turno, e a mídia não cansa de propagar a “vitória da Marina”. Não aceite esse presente de grego. Hão de descartá-la assim que você falar qual é exatamente a sua luta e contra quem ela se dirige.
“Marina, você faça tudo, mas faça o favor”: não deixe que a pintem de azul tucano. Sua história não permite isso. E não deixe que seus eleitores se iludam acreditando que você está mais perto de Serra do que de Dilma. Que não pensem que sua luta pode torná-la neutra ou que pensem que para você “tanto faz”. Que os percalços e dificuldades que você teve no Governo Lula não a façam esquecer os 8 anos de FHC e os 500 anos de domínio absoluto da Casagrande no país cuja maioria vive na senzala. Não deixe que pintem “esse rosto que o povo gosta, que gosta e é só dele”.
Dilma, admitamos, não é a candidata de nossos sonhos. Mas Serra o é de nossos mais terríveis pesadelos. Ajude-nos a enfrentá-lo. Você não precisa dos paparicos da elite brasileira e de seus meios de comunicação. “Marina, você já é bonita com o que Deus lhe deu”.

* Professor de filosofia da UFES, autor de Iara e a Arca da Filosofia (Mercuryo Jovem), entre outros.


domingo, 3 de outubro de 2010

A Origem: um filme para abalar convicções

O filme "A Origem" (Inception, EUA, 2010. Direção: Christopher Nolan) convida o espectador a mergulhar no universo dos sonhos qual um caçador de pérolas que vai buscar seu tesouro sob as águas, em abismo incerto. No caso, o tesouro consiste na gênese das nossas convicções, a origem das certezas que determinam nossas escolhas e influenciam o cotidiano.

Dom Cobb (Leonardo DiCaprio) é um ladrão de sonhos, reconhecido como o melhor de todos. Ele domina com maestria a perigosa arte de invadir sonhos alheios para arrancar informações que podem valer milhões de dólares no competitivo mercado das grandes corporações.

O pedido de um cliente, no entanto, é considerada uma empreitada arriscadíssima até para o experiente Cobb. Ao invés de roubar informações, ele precisará mergulhar nos sonhos do magnata da área energética Robert Fischer (Cillian Murphy) para plantar uma ideia que posteriormente resultará em decisões que interessam ao contratante. Para isso, ele precisará explorar profundamente a psique da vítima, invadindo sonhos após sonhos, um dentro do outro, até um nível seminal no qual a semente possa ser lançada.


Cobb só aceita o risco porque receberá como recompensa a possibilidade de se reunir novamente aos filhos nos EUA, de onde fugiu por causa da acusação de ter matado a própria esposa Mal (Marion Cotillard).

Dom Cobb não age sozinho. Sobre os demais personagens, vale a pena ler duas postagens em blogs: o Saindo da Matrix (clique) faz uma interessante exegese dos nomes dos personagens; já o The World Is Garbage! (clique) analisa os personagens na perspectiva dos arquétipos junguianos.

É deliciosamente perturbadora a dúvida que Christopher Nolan semeia com seu festejado filme: qual é a origem das nossas convicções? Pode ser perturbador nos darmos conta de que algumas das nossas crenças mais firmes resultam de intervenções (na psicanálise, a condução do fluxo de pensamentos por outrem) efetivadas pela família, pela igreja, pela escola, pelo Estado, pelo discurso hegemônico dos meios de comunicação etc. Por outro lado, é delicioso ser lembrado que nossas certezas podem não ser assim tão certas, o que nos desobriga de cumpri-las ao pé da letra.

A Origem é um filme antológico repleto de efeitos especiais absolutamente necessários, diferentemente do que se vê frequentemente nas produções hollywoodianas.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

A pieguice de Vik Muniz

Que tal comprar uma jóia e carregar a embalagem pendurada no peito? Guardadas as diferenças, é o que propõe a mostra “Verso”, do festejado artista plástico Vik Muniz, inaugurada hoje na Galeria Fortes Vilaça, em São Paulo.


Embora diferente, a ideia é simples: mostrar o verso de obras célebres como “Les Demoiselles d’Avignon”, de Picasso, “Starry Night”, de Van Gogh, “Samba”, de Di Cavalcanti e “O Abaporu”, de Tarsila do Amaral, entre outras, devidamente identificadas com inscrições à mão e etiquetadas pelos museus onde já foram expostas. Não contente com a esquisitice de mostrar apenas o dorso das obras famosas, o artista o faz apresentando reproduções.

Desde que Duchamp levou urinol e roda de bicicleta para dentro das galerias, as artes visuais encontraram uma nova expressão – tridimensional e desvinculada da representação formal. Ocorre que Duchamp era um tirador de sarro que certamente rola de rir na tumba com a “pagação de pau” das plateias compenetradas diante de seu urinol-arte – como tive oportunidade de presenciar na exposição comemorativa dos 60 anos do MAM de São Paulo, ocorrida em 2008. “Banalizaram a arte!”, gritava o urinol de Duchamp para a sociedade da época. Pois a atual consegue ser pior, sacralizando banalidades.

Vik Muniz ficou conhecido nos anos 1990 por utilizar materiais inusitados para reproduzir imagens consagradas, como a Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, reproduzida com pasta de amendoim, e obras de Monet reproduzidas com açúcar mascavo. Quem adquire as “obras” leva para casa apenas a reprodução fotográfica das mesmas. Ou seja, o festejado artista vende reproduções de reproduções.

Ao apresentar cópias (muito bem acabadas) do verso das obras, Muniz propõe trocar a fruição estética pela atitude consumista, reforçando o primado do objeto sobre o conceito, do tangível sobre o intangível, do palpável sobre o abstrato, da embalagem sobre o conteúdo. Exibir a caixa de jóias no peito é piegas, todos hão de convir, da mesma forma como talvez concordem que é piegas a mostra de Vik Muniz.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

McDonald’s e Franz Kafka: tudo a ver

Tudo que queríamos era tomar um singelo sorvete. Andávamos sem rumo pela avenida Paulista no fim de um longo domingo e a opção mais óbvia foi o McDonald’s. Lá fomos eu, Fernanda, Alice, Pedro e Douglas.

O desejo por sorvete não combinava com o clima. Chá quente ou capuccino era o que o vento gelado recomendava, mas queríamos sorvete.
Entramos no McDonald's e constatei aliviado que estava vazio. O balcão de sorvetes perto da entrada permite fazer pedidos tanto de dentro da loja, onde estávamos, como do lado de fora, onde há uma simpática varanda. Fizemos o óbvio: dirigimo-nos à atendente e pedimos pelo número.
– Senhor, só posso te atender pelo lado de fora.
– Ãhh?!?!
– O senhor tem que ir do lado de fora da loja, para fazer o pedido.
– Como assim?
– Não posso te atender por aqui. O senhor precisa sair da loja e dirigir-se à varanda, para fazer o pedido.
– Mas moça, aqui há um balcão, eu estou te vendo e você me vê, estamos um ouvindo o outro. Não posso fazer meu pedido?
– Por aqui, não. A câmera não deixa.
– Câmera? Que câmera?
– Aquela ali. Ela está ligada e eu não posso te atender por aqui.
– Mas...
Solenemente, a atendente me deu as costas e chamou: – Próximo!
Era a cena do mês. A mais esquisita.
– Moça, por favor. Eu ainda não entendi. Por que preciso sair da loja para ser atendido?
Visivelmente irritada, ela me ignorou.
Eu não sou chato. Resignado, saí para o frio e fui até à parte externa do balcão. Foram pedidos milk shakes, sundaes e outras delícias padronizadas. Para mim, apenas uma casquinha mista, de chocolate e creme.
– Aqui só temos creme. Se o senhor quiser chocolate, terá que pedir no balcão principal.
– Aquele que fica dentro da loja?
– Isso mesmo. Qual sabor o senhor vai querer?
– Quero casquinha mista, de chocolate e creme.
– Aqui só temos creme.
– Lá dentro tem misto?
– Não. Lá só tem chocolate.
– Ãhhhh?!?!
– Sim. Aqui só tem creme. Lá dentro, só chocolate. Qual o senhor vai querer?
– Quero os dois juntos. Misto, entende?
– Não tem.
– Mas está no cardápio.
– Eu sei, mas não tem. Qual o senhor quer?
– Puxa, moça. Está difícil. Eu queria misto.
– Então o senhor decide enquanto atendo outro cliente. Próximo!
– Já decidi, moça. Me dá qualquer um que você tiver aí.
– Qual?
– Qualquer um.
– O senhor tem que dizer. A câmera está ligada e o senhor tem que falar qual é o seu pedido.
– Tá bom. Eu quero de creme. É esse que tem aqui fora ou é o de lá de dentro?
– Não. Creme é aqui mesmo. São R$ 1,50. Algo mais?
– Só isso. Aliás, mais uma pergunta: depois que comprar o sorvete eu posso entrar na loja para tomar lá dentro? Aqui está frio.
– Pode.

Se você aí lembrou de Franz Kafka, acertou na mosca. Sendo mais específico, na barata, pois o asqueroso ser que surgiu do nada e começou a passear livremente pelo chão da lanchonete, como se conferisse o "bom" atendimento dado à clientela, parecia saído do romance Metamorfose (download gratuito). Rapidamente saquei o celular com a intenção de fotografar a ilustre presença, mas ele é uma péssima câmera fotográfica. Fico devendo o registro.

domingo, 4 de outubro de 2009

Falta alma ao Ballet de Marseille

A apresentação do Ballet National de Marseille é um belo espetáculo pelos cenários e figurinos e pela boa iluminação. Praticamente só por isso. Embora os dançarinos atuem com precisão, apresentando o sincronismo que se espera de um grupo de dança, falta um pouco de vibração. Se os dançarinos vibram pouco, a plateia reage também com pouco entusiasmo, como se dissesse que esperava "algo mais".

Frédéric Flamand, diretor e coreógrafo do grupo, foi convidado pelo governo francês para assumir o Ballet de Marseille depois de uma bem sucedida trajetória à frente da companhia belga Plan K, fundada por ele próprio. Posteriormente, assumiu a direção do Ballet Royal de Wallonie, que rebatizou para Charleroi/Danses. O texto de apresentação do espetáculo informa que Flamand gosta de explorar o espaço e a arquitetura em suas coreografias, o que fica evidente no espetáculo Métamorphoses apresentado no Teatro Alfa de São Paulo, em curta temporada de 2 a 4 de outubro. Na primeira parte, uma representação do começo da vida e de seu desenvolvimento, com toda a sua complexidade, seus dilemas e crises. Na iluminação, predomina um asséptico branco. Em seguida, uma fase industrial, com sons mais pesados, pouca iluminação e cores vibrantes nos figurinos, formando o ponto alto do espetáculo juntamente com a fase seguinte, tecnológica. Cenários e figurinos são assinados pelos irmãos designers brasileiros Humberto e Fernando Campana.

De fato é um belo espetáculo que, provavelmente, cativou muitas plateias na Europa. Entretanto, na terra do samba, é preciso mais que coreografia perfeita e figurinos modernos para conquistar as plateias. É preciso dançar com o corpo e com a alma.

Em tempo: a apresentação do Ballet National de Marseille faz parte das comemorações do Ano da França no Brasil.

domingo, 8 de março de 2009

Ah!, Maria Rita

Ontem fui ao show da Maria Rita no SESC Pinheiros. Sorte minha estar lá, pois o público foi brindado com uma apresentação primorosa de uma cantora cuja interpretação amadureceu significativamente nos últimos anos. Percebe-se facilmente que ela tem trabalhado duro para superar a timidez e dialogar com o público, revelando um grande carisma. Isso sem falar no delicioso sorriso da Maria Rita...
Firmar-se como cantora sendo filha de Elis Regina não deve ter sido tarefa das mais fáceis. As comparações com a mãe são inevitáveis e o muxoxo da turma do cotovelo doído, acusando favorecimento das gravadoras à jovem cantora, deve ter tornado ainda mais áspero o início da carreira no começo da década de 2000. Atualmente, nada disso a afeta mais. Ela esbanja talento com uma voz afinadíssima e com exuberante presença de palco. Isso sem falar nas roupas provocantes da Maria Rita...
As apresentações ocorridas de 5 a 8 de março fazem parte do lançamento do DVD “Samba Meu” que, além de composições inéditas, traz músicas já consagradas na voz da cantora, como “Cara Valente”, “Encontros e Despedidas” e “Caminho das Águas”. Nestas, o público não se contém, forma um grande coral e no fim do show metade da plateia está em pé nas laterais do anfiteatro sambando em obediência ao apelo dos compositores Edson e Aluísio: “Não deixe o samba morrer / não deixe o samba acabar / O morro foi feito de samba / De samba pra gente sambar”. Isso sem falar no rebolado da Maria Rita...
Como se vê, o samba não morreu. Apenas ocupou espaços antes impensáveis e conquistou novos adeptos: desceu o morro para se instalar em palcos sofisticados e encantar platéias da classe média e da intelectualidade. É para este público, especificamente, que Maria Rita se apresenta. O morro, pobre morro, não pode vê-la cantando que “O morro foi feito de samba”. Isso sem falar nas coxas da Maria Rita...

domingo, 21 de dezembro de 2008

Os Bandidos, de Schiller, no Teatro Oficina

Ontem comecei a voltar à vida. Primeiro dia de férias, pós-graduação (lato sensu) concluída, aprovado para o mestrado em 2009, pude voltar a fazer algo que gosto muito: observar a cena cultural paulistana.

Decidi começar pelo Teatro Oficina, que conheço de longa data. A ocasião era propícia, pois tratava-se do último fim de semana da peça Os Bandidos, de Friedrich Schiller, com direção, obviamente, de José Celso Martinez Correa e encenação do grupo Uzyna Uzona. A motivação a mais encontrei no ótimo texto do ator Pascoal da Conceição (Castelo Rá-Tim-Bum), publicado na Folha desta semana – não me lembro o dia – sobre o espetáculo.

Não vou gastar adjetivos falando sobre o Oficina. O que penso sobre Zé Celso e o seu teatro estão resumidos num breve ensaio publicado no meu outro blog. Confira.

Já o espetáculo... esse é difícil descrever. Definir então, pior ainda. À complexidade do texto e da montagem, some-se as 6 horas de duração da peça. A expressão que me vem com mais força é hard core, embora certamente não seja a mais adequada. Do ponto de vista formal, o texto de Schiller faz parte do Sturm und drang, movimento alemão que se opôs ao iluminismo racional do século XVIII propondo uma literatura selvagem e primitiva – espontânea, acima de tudo –, do qual Schiller e Goethe são os principais representantes. No Oficina, assimilado e reinventado (antropofagiado) pelo modernista tardio Zé Celso, o Sturm und drang virou strumedomangue.

A encenação começa na rua, antes de os portões do Teatro serem abertos. Os atores vêm para fora cantando e dançando, dão as mãos a quem estiver por perto e formam uma imensa roda que impede o trânsito. Os carros começam a buzinar impacientes, mas ninguém se incomoda. A única preocupação da trupe é criar sintonia com a platéia e prepará-la para a profusão de emoções que se seguirá. A cantora Céllia Nascimento, paramentada de pomba-gira, entoa com ótima voz:

“Exu é duas cabeças
Ele olha sua banda com fé
Uma é Satanás no inferno
A outra é Jesus de Nazaré”

O aviso está dado. Daí para adiante, quem entra no recinto o faz por conta e risco próprios. Mas ninguém vai embora.

Adaptado para, mais uma vez, denunciar a luta entre o Oficina e o grupo Sílvio Santos, vizinhos de calçada que vivem uma rixa de décadas, o enredo apresenta um decadente magnata da TV que vive o drama de ter um filho renegado e chefe de bando, Damian, e outro, Cosmus, ambicioso ao ponto de tramar a morte do pai. Aparentemente, uma história banal. Porém, o modo como a história é contada faz toda a diferença. Esqueça a cena francesa, linear, calma como a narração da vovó. Os 19 atores e três figurantes correm, saltam, cantam, dançam, gritam, sobem escadas, transformam-se em fantoches, ficam nus, simulam estupros e relações homossexuais, xingam muito, cospem, dão tiros uns nos outros, cheiram cocaína com bomba de flit, entre outras performances. Excelentes músicos criam o background perfeito, do trompete solitário ao estrondoso solo de bateria.

Apesar da profusão de estímulos jogados sobre o público, nada é gratuito. Os atores não ficam nus para chamar a atenção, como nos carros alegóricos do carnaval. Apenas atuam para além do comum. Tanto, que ninguém do público se sente autorizado a enxergá-los diferentes do que são: personagens do drama que paira sobre todos nós, o drama da luta do bem contra o mal, no qual o que parece bom pode revelar-se extremamente perverso, e o mau às vezes não é como o descrevem.

“Exu é duas cabeças
Ele olha sua banda com fé
Uma é Satanás no inferno
A outra é Jesus de Nazaré”.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Chegou a hora da Virada


O dia está chegando: em 26 e 27 de abril, próximo fim de semana, acontecerá em São Paulo a quarta edição da Virada Cultural.
Para quem não mora na cidade e ainda não conhece o evento, a Virada consiste numa extensa programação cultural com 24 horas de duração, espalhada pelo Centro e pelos bairros.
É tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que fica até difícil escolher o que assistir. Para que se tenha idéia, só na área musical, a edição deste ano traz os seguintes destaques:
Gal Costa (MPB) - Palco da São João, às 21h
Cesária Évora (Worl Music) - Palco da São João, às 18h (sábado)
Arnaldo Antunes (Rock) - Praça da República, às 14h
Fernanda Takai (Rock) - Esquina da Av. Ipiranga com Rua Araújo (Palco das Meninas), às 17h
Jorge Ben Jor (Samba-Rock) - Palco da São João, às 18h (domingo)
O Teatro Mágico (Rock performático) - Palco da São João, às 9h
Marcelo D2 (Rap) - Palco da São João, às 12h
Zé Ramalho (MPB) - Palco da São João, à 0h
Lobão (Rock) - Praça da República, às 16h
Jair Rodrigues e Zimbo Trio (MPB) - Teatro Municipal (Praça Ramos), às 18h (domingo)
Luís Melodia (Samba) - Teatro Municipal (Praça Ramos), às 18h (sábado)
Ultraje a Rigor (Rock) - Praça da República, às 18h (domingo)
Sérgio Reis (Sertanejo) - Mercado Municipal, às 16h
Em palco montado na Rua XV de Novembro, os amantes da música eletrônica poderão assistir às performances de DJ's consagrados e dançar os hit's do momento. Além disso, haverá discotecagem diretamente em fones de ouvido, distribuídos ao público.
A programação de dança, que acontecerá no Vale do Anhangabaú, terá como destaques:
Corpo de Baile do Teatro Municipal do RJ, com Ana Botafogo - 18h10 (sábado)
Balé da Cidade - 22h30
Índios Pankararus - 5h30
Ballet Stagium - 13h00
Cisne Negro - 17h00
A programação teatral acontecerá na Praça Roosevelt e contará com a participação de:
Os Parlapatões
Os Satyros
Estúdio 184
Os cinéfilos também não foram esquecidos: na praça Ramos de Azevedo, ao lado do Teatro Municipal, haverá exibição de filmes do Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, em telão, durante o intervalo dos shows.
Já na Galeria Olido, no Largo do Paissandu, acontecerá a Mostra Internacional de Cinema na Virada, com filmes a partir das 18h do sábado até as 16h do domingo.
Quer mais? Tem muito mais em todas as unidades do SESC, no Centro Cultural Vergueiro e nos CEUs. Clique aqui e confira a extensa programação da Virada Cultural de São Paulo. Imperdível.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Hora de trocar preocupação por barro molhado


Já passa de um ano que ocupo meus sábados, manhã e tarde, com a pós-graduação no Instituto de Artes da UNESP. Gostei de muita coisa que aprendi, outras nem cheguei a aprender, mas nada se compara às sensações que a disciplina “Cerâmica, criatividade e panorama histórico” têm me proporcionado. Ministrada pela professora-doutora Geralda Dalglisch, a “Lalada” como ela gosta de ser chamada, a disciplina propõe um conhecimento da arte ceramista para além dos registros históricos e de sua importância antropológica – conforme sugerido no título –, exigindo vivência da arte, o que significa, literalmente, pôr a mão na massa.
No começo não achei nada divertido, mas concordei em comprar os 10 kg de argila necessários para as primeiras experiências, além de pincéis, azulejos, colher, barbante, tesoura e outros apetrechos. Na primeira aula prática fiquei meia hora olhando o material e as ferramentas, sem a menor disposição para começar. Aliás, começar o quê?? Não tenho nenhuma habilidade com as mãos e nem paciência para criar formas que mereçam ser admiradas. Apesar do incentivo dos colegas, optei pela fuga. Isso mesmo: aquele monte de barro me intimidou.
Na semana seguinte, lá estava a argila me esperando e então não tive opção senão encará-la. Comecei com raiva, decidido a fazer o que fosse necessário para acabar logo com aquilo. Para meu desespero, descobri que o primeiro trabalho não utilizava nem 20% do torrão molhado pelo qual paguei R$ 20,00. E agora? A única saída era pensar em outras peças para gastar a argila o mais rapidamente possível. Mas aí, epa! não é que comecei a gostar? Sem mais nem menos, me flagrei pensando em comprar mais argila para continuar a brincadeira em casa – criar objetos, compor mosaicos, imitar formas, modelar, experimentar... enfim, reviver as tardes de sábado no ateliê da pós, em que uma preocupação se torna maior que todas, mais importante e mais urgente, expulsando as demais: a preocupação com a forma a ser dada ao barro molhado que tenho diante de mim.
Nunca pensei em ser artista. Acho que nunca serei, pois não tenho jeito para a coisa. Mas confesso que essa história de, de vez quando, trocar um monte de preocupações por um monte de barro, está me seduzindo...

A quem possa interessar: o lato sensu “Fundamentos da Cultura e das Artes” é oferecido pelo Instituto de Artes da UNESP a cada dois anos. Mais informações podem ser obtidas na página do Instituto:
www.ia.unesp.br.